Melhoremos nossas almas

A correria do dia a dia tem colaborado para o relógio andar mais rápido, falta tempo para o invisível que nos preenche

Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo

28/07/2025
Melhoremos nossas almas Freepik/NBE

3 min de leitura

Nos últimos dias, reencontrei amigos de várias fases da vida. Gente que fez e faz parte de momentos marcantes da minha existência. Também nos últimos dias, partiram para outra dimensão pessoas com quem eu queria ter estreitado amizades. Ter feito mais coisas juntos. Mas que não investi tempo.

Queria ter ouvido mais os poemas e convivido com a sabedoria do Mario Pirata. Também não consegui conhecer novos ateliês e fazer o curso de papel machê com o grande artista e criativo Cho Dorneles.

A correria do dia a dia tem colaborado para o relógio andar mais rápido, falta tempo para o invisível que nos preenche. Se para uns, sentir a magnitude divina é possível através da oração, da proximidade da natureza ou de rituais ou de experiências, creio que estar entre pessoas que nos fazem bem também é uma forma de sentir a plenitude.

Estar entre amigas e amigos é uma forma da gente se dar por conta de ângulos que passam batido quando entramos no automático. Reencontrar amigos de décadas atrás é um jeito de percebermos como já fomos piores.

Acordar para os descaminhos que tomamos e que cada um, do seu jeito, conseguiu seguir o rumo no qual foi possível.

Nesse sistema em que estamos mergulhados - que ora precisamos saber nadar, respirar com a barriga para cima ou mesmo nos agarrar em algum tipo de boia para sobreviver - frequentemente me deparo com gente mega talentosa, mas que sofre para conseguir se manter, para segurar a onda em meio a desafios familiares.

Talvez seja porque me identifico, pois não é fácil se manter na engrenagem desse sistema cada vez mais desafiador. Hoje também está comum as pessoas terem problemas de saúde mental ou emocional.

Cuidado com a amizade

O mundo está em crise em tantos aspectos, que exige mais que resiliência, uma sabedoria, uma forma de interpretar os cenários, que esse sistema tecno-feudalista, como chama Yanis Varoufakis, não tem como preencher. O afeto, o abraço, o olhar, nenhum tipo de Inteligência Virtual recriará.

Creio que é uma vantagem termos amizades de várias faixas etárias e de tribos diferentes por todos os lugares que passamos. Quanto mais tivermos chance de compreender o que nos cerca com óculos de lentes distintas, mais possibilidades teremos de compreender o que está acontecendo. Só que a amizade verdadeira requer cuidado. É como uma planta, precisa de água, de sol, de terra, que se não dermos a devida atenção, ela sucumbe.

Venho acompanhando, nos últimos anos, a tristeza que bate naqueles que vão perdendo os amigos devido a doenças precoces ou à velhice. Uma das melhores amigas de minha tia, por exemplo, ficou doente e o filho levou-a para outra cidade, em outro estado. A amiga partiu pouco tempo depois e minha tia nem conseguiu se despedir dela. Isso é comum, faz parte da vida, você pode me dizer. Sim, por isso mesmo que escrevo essas linhas. É para reforçar que coloquemos como prioridade a convivência entre as pessoas que nos fazem bem, ou melhor, que são cúmplices na nossa loucura ou da nossa lucidez.

Para encerrar, publico um poema do Mário Pirata, que peguei de outro amigo que publicou em uma rede social.

Mário se foi dia 20 de julho, Dia do Amigo.

cuidem-se, camaradas

melhoremos nossas almas

temos uma civilização nova

para transformar

em algo mais saudável

e admirável do que tudo isso

que estamos deixando para trás

nossos sonhares são os altares

ninguém pode tirar isso de alguém

nem que se queimem os ares

nem que se sequem as terras

nem que se rasguem os mares

Mário Pirata (1957-2025)

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Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo é jornalista, "artivista" e participa de coletivos e redes onde procura articular ações e disseminar informações sobre como a comunicação se relaciona com a sustentabilidade. Instagram @silmarcuzzo

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