Mão no verde

Com a proximidade da primavera, a explosão de flores dos cítricos que tenho aqui em casa deixa qualquer pessoa sensível enebriada pelo perfume

Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo

16/09/2025
Mão no verde Freepik/NBE

4 min de leitura

Desde que fomos obrigados a ficar em casa, durante a pandemia, meu marido, adorador de pássaros, vem anotando a chegada de andorinhões-do-temporal (Chaetura meridionalis) que aparecem no horizonte do nosso apartamento, em Porto Alegre.

Nos últimos anos, mais precisamente em 2021, chegaram em 30 de agosto. Em 2022, em 24 de agosto e, nos últimos três anos, exatamente no dia 29 de agosto. Eles ficam aqui até abril. Em 2021, 22 e 23, eles não foram mais avistados a partir de 14 de abril. Em 2024, desapareceram em 19 de abril e, em 2025, não foram mais vistos a partir de 15 de abril.

E sabem de onde essa espécie vem? Da Amazônia, cruza o Brasil para chegar ao Rio Grande do Sul, onde há comida abundante nesta época do ano. É uma ave pouco estudada, não se sabe exatamente de onde elas vêm do nosso maior bioma.

Ave voando no céu

Foto: Luiz Carlos Ramassotti

Como tudo na natureza funciona em rede, eles chegam ao Rio Grande do Sul para se alimentar porque nosso ambiente tem insetos e outros bichos que essas aves comem. Se gostas desse tema, recomendo o canal Planeta Aves, do ornitólogo Willian Menq.

Aliás, chegam outras espécies migratórias para passar boa parte do tempo em Porto Alegre e região. Em outras partes do Estado, outras espécies também se dividem entre o hemisfério norte e o Rio Grande do Sul. Só para teres uma ideia, o primeiro Clube de Observação de Aves do país nasceu aqui em Porto Alegre, o COAPOA, que foi fundado por um dos mais importantes ornitólogos que passaram pelo país, William Belton.

Mas e daí, podes me indagar, o que eu ganho sabendo com isso? O que nós temos a ver com isso?

Ora, tchê, primeiro: evidencia a importância das áreas naturais e outras antropizadas, que foram mudadas pelas pessoas, que ainda oferecem comida para uma espécie cruzar o país e vir engordar aqui. Segundo, que essa é uma informação que estás tendo acesso aqui, resultado de uma observação, que desconfio que não haja pesquisa de órgãos oficiais sobre esse caso.

E outra: se tu ainda não te deste conta de que precisamos de árvores, espaços com mata ciliar, campos, jardins, recantos de vida para que a avifauna se mantenha, tu precisas acordar, porque a nossa espécie depende desses e outros animais para termos qualidade de vida.

E tem mais: sugiro aproveitares que esse texto é feito por gente de carne e osso, sem qualquer plágio ou fruto de algum conteúdo mediado via Inteligência Artificial.

No ar e na terra

Com a proximidade da primavera, a explosão de flores dos cítricos que tenho aqui em casa deixa qualquer pessoa sensível enebriada pelo perfume. E o legal é observar os vários tipos de artrópodes, leia-se abelhas, zangões, vespas, formigas, que essas joias da natureza atraem.

De tantas flores, apenas algumas vão conseguir se transformar em fruto. Nesse ano, devido a tudo que passamos no ano passado (a catástrofe socioambiental que desfigurou nossas paisagens em 2024), a colheita de laranjas e bergamotas foi escassa. A frutinha precisa estar muito segura de si, firme, que nem cinto em calça de gente magra, para suportar rajadas de vento, chuvaradas e até ciclones que têm arrastado boa parte do que passa pela frente.

Se, para uns, esse assunto pode ser desprezível, para mim, abordar os mecanismos de funcionamento da natureza, creio ser fundamental para esses tempos de mudanças climáticas.

Em um espaço urbano cada vez mais conquistado pelo cimento, argamassa e asfalto (ainda mais onde as administrações são íntimas de empreiteiras e construtoras), precisamos compreender o modo que os seres vivos interagem e vivem. Por isso, sugiro que, se puderes ter um espacinho, nem que seja na janela, na sacada ou no pátio com algumas árvores frutíferas e flores, vale demais acompanhar as mudanças dessas plantas a cada estação.

Além de nos fazerem despertar para o lado bom de estarmos respirando e atraindo pássaros, borboletas e o que mais vier – desde que não tenhas felinos para tentar derrubá-los – também é uma forma de reter um pouco a água da chuva, que pode estar contribuindo para aumentar a área alagada no térreo.

Aqui no terraço, adotamos um meio de regular a vazão. A água que cai no telhado é direcionada por uma calha que deságua em uma bombona. Quando chove muito forte, abrimos a torneirinha para assim regular minimamente a vazão.

Com tudo que estamos vivendo, nada melhor do que sair da frente das telas e colocar a mão no verde, na terra, naquilo que tem vida. São medidas de adaptação local, que impactam o ambiente onde vivemos.

Compartilhe

Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo

Sílvia Marcuzzo é jornalista, "artivista" e participa de coletivos e redes onde procura articular ações e disseminar informações sobre como a comunicação se relaciona com a sustentabilidade. Instagram @silmarcuzzo

Também pode te interessar

blog photo

A dor que ninguém vê, o corpo que carrega em silêncio

Setembro Amarelo não é apenas sobre suicídio. É sobre tudo o que vem antes disso

Angela Schmidt

Angela Schmidt

blog photo

O poder invisível das conexões humanas

O que o Método CURAR® revela sobre o que nos adoece e o que nos salva

Angela Schmidt

Angela Schmidt

blog photo

Minha pátria é a Terra

Um novo nível de consciência torna ridícula e fora do tempo a afirmação excludente das nacionalidades

Leonardo Boff

Leonardo Boff

simbolo Bem Estar

Receba conteúdos que te inspiram a viver bem

Assine nossa newsletter e ganhe um universo de bem-estar direto no seu e-mail